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Como a saúde mental afeta sua produtividade

Patrícia Rodrigues
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Psicóloga e professora de Gestão de Pessoas fala sobre os impactos da saúde mental no trabalho e desmistifica a ideia de que dá para separar o pessoal do profissional  

Historicamente, sempre ouvimos que é preciso separar a vida pessoal da profissional. No entanto, essa herança da era industrial e pós-industrial é algo que não funciona mais. “É uma ilusão, pois não dá para desvincular todas as esferas individuais do cotidiano de trabalho”, explica a psicóloga Marcia Portazio, docente das disciplinas Gestão de Pessoas, Gestão por Competências e Gestão de Mudanças da ESPM. “O preço que a sociedade paga por essa ‘separação’ é o que chamamos de doença mental”, define. “Em 30 anos de atendimento, muitos problemas emocionais dos pacientes tinham origem em suas vidas profissionais.”

Não é de se estranhar. Afinal, passamos grande parte de nossa vida dentro dos ambientes de trabalho. E, ainda mais agora em home office, essa relação se tornou ainda mais estreita, especialmente pelo uso da tecnologia que facilita muita coisa, mas também alimenta esse vínculo. “Com as novas ferramentas digitais, não há mais limite e essa carga horária é extrapolada. Não há mais o ritual de desligar o computador, fechar a gaveta e ir para casa”, lembra. “Por isso, não tem como pedir para o indivíduo deixar seu psiquismo e sua vida emocional do lado de fora. Muito menos agora.”

Saúde mental x desempenho

Em maio, o secretário-geral da ONU, Antônio Guterres, alertou para os problemas causados pelos transtornos psicológicos decorrentes da pandemia e cobrou ações das autoridades. “Serviços de saúde mental são parte essencial de todas as respostas governamentais à covid-19. Eles devem ser ampliados e totalmente financiados”, comentou Guterres. Muitas empresas acabaram desenvolvendo ações de apoio psicológicos aos funcionários. “Elas estão percebendo, que a saúde mental de seus colaboradores influi diretamente no desempenho e na produtividade. Quanto mais saúde mental, mais ânimo, disposição, energia, clareza de ideias para ter criatividade e iniciativa para enfrentar os desafios profissionais”, observa a psicóloga.

Mau humor, irritação, tristeza, raiva, frustração diante das contrariedades são alguns dos sinais de que a pessoa pode não estar lidando bem com algumas questões. A qualidade da saúde mental afeta muito a concentração, causa lentidão no raciocínio e na execução de tarefas: o mal-estar psíquico exige que toda a atenção e energia fiquem voltadas para determinado pensamento. “Uma emoção negativa deixa a pessoa refém do processo mental, impedindo não só o desenvolvimento das tarefas com qualidade, mas também a solução de problemas”, acrescenta Marcia.

Máquina sobrecarregada

Também não dá para mergulhar no trabalho e fazer de conta que nada está acontecendo para garantir produtividade. “É como colocar a sujeira embaixo do tapete. Vira um transtorno, eles aumentam e, mais dia menos dia, a pessoa irá tropeçar”, alerta a especialista.  Reprimir os pensamentos negativos provoca looping (vão e voltam na cabeça) e gasto energético dobrado (atenção para manter o foco nas tarefas e também para não pensar no que incomoda). “A energia psíquica trabalhando interruptamente é como um carro desregulado, que consome muito mais combustível e nos deixa muito cansados.”

Nosso corpo, assim como nosso psiquismo, são como máquinas que, quando sobrecarregadas, produzem uma série de transtornos físicos — que vão de problemas mais ‘simples’, como as dores na coluna, no estômago e gastrite à pressão alta, doenças coronárias, cardiovasculares, como os AVCs e infartos que acometem pessoas cada vez mais jovens. “Hoje são doenças reconhecidamente de origem psicossomática e causadas por sobrecargas mentais que, nas formas mais graves, aparecem como depressão, ansiedade e pânico”, avalia a professora.

Por que a saúde mental precisa entrar na conta

Afastamentos do trabalho e quedas na produtividade têm, claro, um impacto financeiro. No entanto, as questões éticas, morais e humanas completam esse cenário — por isso, as empresas podem se antecipar com políticas para garantir a qualidade de vida e saúde física e mental de seus funcionários. Atividades coletivas ou individuais, rodas de conversa, contratação de psicólogos para atendimento individual e/ou coletivo, inclusive online, têm sido práticas bem comuns, especialmente no período da pandemia.

De acordo com a professora, é preciso adotar a postura de que “empresas não são instituições autônomas, mas sim feitas, formadas e comandadas por pessoas” — não importa o seu tamanho. Mais que isso, também precisam preparar seus líderes, enquanto figuras de autoridade, para tratar com tudo isso. Afinal, são eles que estão na linha de frente junto com seus colaboradores.

“Apesar de serem escolhidos por suas aptidões e qualidades técnicas, nem sempre estão aptos para lidar com a questão humana, seja própria ou dos outros”, analisa Marcia. “Esse aspecto nas lideranças é completamente negligenciado, sendo que uma enorme parte dos problemas emocionais tem origem dentro das empresas, consideradas uma das maiores fontes de estresse dos indivíduos.”

Entre as causas mais comuns estão o cumprimento de metas irreais, demandas abusivas, carga excessiva de trabalho, intimidações, agressividade e bullying que, de acordo com a especialista, têm aumentado muito na pandemia. “As pessoas estão muito mal emocionalmente e, sem perceber, elas estão descarregando isso umas nas outras.”

Líderes que ouvem

Abrir espaço para conversar sobre as emoções e os relacionamentos figura entre as medidas para ampliar as políticas de saúde mental no âmbito profissional. “Administrar inclui não fugir desses assuntos que são considerados complicados”, pondera a professora. Ela explica que, historicamente, há uma grande dificuldade de encarar o lado negativo, seja o próprio ou o dos outros. “Falamos muito em empatia como a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro. Isso não é verdade porque cada um tem características, personalidades e histórias de vida distintas que produzem um funcionamento psíquico próprio e único.”

Então, na prática tornam-se mais importantes a solidariedade “de saber ouvir” e “uma boa e velha conversa”. “Muitas vezes a pessoa só precisa de alguém que a escute. Só o fato de elaborar um discurso já traz um enorme alívio: o que era uma entidade misteriosa transforma-se em algo concreto, com nome, causa e efeito.”

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Patrícia Rodrigues

Jornalista colaboradora do Trendings.

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