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“O consumidor está mais sensível a promoções em um momento em que cada real faz a diferença”

Jorge Tarquini
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A afirmação é de Alan Kuhar, professor de Fundamentos de Marketing e Trade Marketing da ESPM. Ele conversou com o Trendings sobre marketing em tempos de isolamento  

Quando um evento das proporções de uma pandemia mundial altera em 180o o rumo da vida tanto das pessoas quanto das marcas, empresas e governos, é preciso ter sensibilidade para encontrar caminhos de empatia para a roda continuar a girar. É natural que no topo da lista de prioridades esteja a sobrevivência de empresas e a manutenção dos empregos. Mas há uma ferramenta poderosa que está marcando presença nesta batalha, proporcionando recursos e respostas que, se não resolvem 100% das questões, tem dado boa contribuição para diminuir estragos: o marketing.

Para radiografar o que tem sido feito nessa área, conversamos com Alan Kuhar, professor de Fundamentos de Marketing e Trade Marketing dos cursos de Administração e Relações Internacionais da ESPM-SP. Catarinense, filho de croatas e fã de rock clássico, Alan é publicitário de formação, mestre em Adminstração de Empresas e doutorando em Gestão Internacional – com passagens profissionais por grandes empresas como Coca-Cola, Unilever, Diageo e Billabong.

Durante a pandemia, o que chamou sua atenção no marketing, do ponto de vista de inovação, sensibilidade para o momento e de enxergar e aproveitar a oportunidade de forma inteligente e até solidária?

Já estamos há quase dois meses resguardados em casa. É até natural que o tom das campanhas publicitárias seja de incentivo para as pessoas se cuidarem e se resguardarem, ficando em casa, sugerindo atividades para desenvolver e apontando um futuro melhor. Grosso modo, são testemunhos encorajadores que são sempre bem-vindos, mas pelo aumento de empresas utilizando esse mote em suas campanhas, fica difícil para um consumidor lembrar exatamente qual empresa o cativou com sua exposição.

Quais movimentos foram os mais notáveis nesse período?

Observamos a reinvenção do atendimento do varejo via modo digital, as empresas precisam se ajustar a este momento complexo. O WhatsApp se tornou uma ferramenta rápida e objetiva de comunicação, cabe ao varejista responder rapidamente e apresentar alternativas de acordo com a demanda de seus consumidores, fechando vendas e organizando novas formas de entrega. Constatamos bares e restaurantes, por exemplo, reorganizando seu cardápio com preços mais competitivos visando o delivery, adaptando sua estrutura de atendimento e de produção para conseguir ter faturamento, entrando em contato diretamente com seus consumidores mais leais – que acabam por assumir o papel de embaixadores, até auxiliando na promoção destes varejistas.

O desempenho do setor de bens de consumo duráveis mostrou fôlego na reação. Como isso se deu?

Vimos o varejo de bens de consumo duráveis selecionando produtos para promoções agressivas de preço com o objetivo de atrair a atenção do consumidor e incentivar aqueles que não tem restrições financeiras a trocarem algum item de maior desembolso em seus lares. Nesse grupo existe uma categoria mais específica, vestuário e acessórios, em que alguns varejistas de moda feminina anteciparam as clássicas liquidações de fim de coleção para antes do Dia das Mães. Não foi raro encontrar descontos de mais de 50%, fazendo com que peças de roupa e calçados literalmente desaparecessem da grade de vendas em questão de minutos.

E como os grandes contribuíram com os pequenos?

Nesse sentido, me chamou mais a atenção uma ação de marketing mais prática do que uma comunicação abrangente, a “Apoie um Restaurante”, feita pela Stella Artois (Ambev), que acabou de receber apoio da Nestlé. Temos uma proibição objetiva de fechamento do varejo alimentício como restaurantes, lanchonetes, cantinas e similares. Concordo com o fechamento neste momento peculiar que vivemos em consequência da pandemia, entretanto, uma cidade como São Paulo, que tem em torno de 20 mil bares e restaurantes que empregam mais de 200 mil pessoas e que sua receita depende em 100% do atendimento ao público, necessita do auxílio de parceiros com o objetivo de reduzir o número de estabelecimentos que podem fechar.

Como funciona a iniciativa “Apoie um Restaurante”?

É um site com milhares de varejos alimentícios cadastrados, divididos entre bares/restaurantes, cafeterias e docerias, onde se pode comprar um voucher com validade até o fim do ano com um desconto de 50%. É uma forma de gerar alguma receita para estes estabelecimentos visto que contas como aluguel, IPTU e salários continua a serem cobradas. Pode não ser a melhor solução para o momento, mas é uma forma dos clientes habituais poderem colaborar com a receita do estabelecimento de sua preferência. Por que gostei tanto desta ação? Fácil responder: ela realmente pode fazer a diferença na sobrevivência de um estabelecimento comercial, é uma ação prática, fácil de usar e com resultados objetivos.

Na outra ponta, deve ter havido também muita iniciativa ou ideia de marketing equivocada ou sem sentido, não?

Falando sobre empresas, confesso que não vi nenhuma cometer um erro grosseiro ou se apresentar de forma oportunista numa época tão peculiar, quando os sentimentos estão aflorados. As campanhas que eu me lembro têm tom respeitoso e otimista, com vistas ao futuro. Minha única crítica fica por conta das pasteurizações das campanhas, dificultando o reconhecimento e, por consequência, a lembrança de uma marca. Também não observei ações apelativas ou oportunistas, lembrando que esta afirmação está baseada apenas no olhar de uma pessoa – e não em um trabalho de campo ou pesquisa com metodologia. Pode ter havido alguma ação de marketing desastrosa que tenha me escapado.

Se as empresas, ao menos no quadro geral, parecem não ter cometido nenhuma grande barbeiragem, o que dizer dos governos?

Ao falarmos de ações de marketing de governos, de forma mais específica as campanhas publicitárias das nossas diferentes esferas governamentais, temos um prato cheio de observações… O tom usualmente é informativo-educativo, por vezes alarmistas conforme esperado nesta ocasião. Independentemente de preferência partidária ou até mesmo de posicionamento pessoal em relação à pandemia, geralmente as campanhas das diferentes esferas de governo são divergentes. Mas há exceções. No caso de São Paulo, houve alinhamento entre prefeitura da capital e governo do Estado – e que tende a educar a população. Entretanto não observei uma campanha no âmbito federal com o mesmo direcionamento, o que pode vir a gerar divergências de comportamento da população. Essa falta de alinhamento na comunicação, que nós sabemos bem qual é a razão, é um desserviço para a população.

Que adaptações você enxergou nas rotinas de trade marketing neste período? Ocupar um espaço privilegiado nas prateleiras continua sendo importante? Ou as estratégias de trade marketing também tiveram de se adaptar aos tempos de coronavírus?

Nossos hábitos de compra mudaram com o coronavírus, uma vez que mudamos de comportamento e rotina – o que é natural e esperado. Os varejistas têm algumas vantagens em relação às indústrias: contato direto com seus consumidores e conhecimento instantâneo na mudança de hábitos de compra, conseguindo reorganizar em poucos dias o seu mix de produtos. Com essas vantagens, o varejista pode facilmente aumentar sua atratividade para seus consumidores tantos os frequentes como os consumidores eventuais. Neste momento de incerteza de perspectivas futuras de curto prazo, uma vez que estamos vivendo o futuro semana-a-semana, e com muitas pessoas infelizmente com a perspectiva de perder o emprego ou mesmo ter redução salarial, o que obviamente chama a atenção do consumidor e ganha a sua preferência é o preço promocional. Mudamos a forma como visitamos um supermercado, nossa diretriz passou a ser mais racional e menos indulgente, estamos mais sensíveis a promoções, preferimos vantagens financeiras uma vez que neste momento cada real faz a diferença.

E como isso influenciou, por exemplo, o ponto de venda dos supermercados?

Os supermercadistas se ajustaram de duas maneiras. Primeiro, reduziram a variedade de produtos dentro de uma mesma categoria, dando foco para os mais vendidos em detrimento de produtos de menor giro e maior margem. E também passaram a se apresentar ao consumidor com promoções e descontos agressivos, haja vista que parte de suas vendas migrou rapidamente para o mundo digital, no qual é rápido e fácil comparar preços e prazos de entrega. Assim, cabe à indústria de bens de consumo não-duráveis correr com packs promocionais, os clássicos leve 5 pague 4, por exemplo, que visualmente são atrativos na gôndola ou no site de um varejista ou uma forma mais simples de dar desconto, porém menos visual que também funciona bem, dando por exemplo 50% de desconto na compra da segunda unidade de um mesmo produto. O comportamento mudou, estamos menos indulgentes e mais práticos com nossas comprar no mercado, o varejo e a indústria que se apresentarem de forma mais atraente, praticando descontos deverá receber a atenção e o dinheiro do consumidor.

Alan Kuhar, professor de Fundamentos de Marketing e Trade Marketing da ESPM
Alan Kuhar, professor de Fundamentos de Marketing e Trade Marketing da ESPM
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Jorge Tarquini

Curador do #Trendings.

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