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‘O poder judiciário é de longe o que mais está aplicando IA’, diz Ronaldo Lemos

Filipe Oliveira
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Especialista em tecnologia participou do Seminário O Futuro do Direito e o Direito do Futuro, promovido pela Folha em parceria com a ESPM

Tecnologias como inteligência artificial, big data e machine learning estão provocando profundas transformações em nossa sociedade. Um processo que acelerou e se intensificou durante a pandemia de covid-19. Entre as áreas em que isso ficou mais evidente está o Direito. “Nos últimos dois anos, tivemos novas iniciativas, tanto estruturais como, por exemplo, do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que instituiu o Juízo 100% Digital”, lembrou Evandro Eduardo Seron, coordenador do grupo de pesquisa Tech Law, do Instituto de Estudos Avançados da USP.

O especialista participou de uma painel sobre os desafios que a tecnologia traz para a atuação jurídica, realizado durante o Seminário O Futuro do Direito e o Direito do Futuro, promovido pela Folha em parceria com a ESPM.

“Vemos agora um momento diferente de alguns anos atrás, acho uma chance de crescer o direito digital e temos que aproveitar esses recursos para poder formular uma política em que todos saiam bem, tanto os escritórios pequenos, quanto os grandes”, afirmou Seron.

Ronaldo Lemos, advogado especialista em tecnologia, que também participou do debate, acredita que estamos passando por um momento de revolução da prática jurídica.  “Essa revolução é ainda mais dramática para o Direito – porque quanto mais antiga uma prática – como o Direito, que é milenar – mais rápida é a transformação que é provocada pela tecnologia nessa profissão”.

Segundo o especialista, a tecnologia está transformando tudo o que faz parte do ecossistema de exercício do Direito no Brasil e o poder judiciário brasileiro tem sido protagonista nesta mudança. “De todos os poderes, de longe é o poder judiciário que está mais desenvolvendo ferramentas e aplicando inteligência artificial em seus serviços”, afirmou Lemos. “Na medida que o serviço se digitaliza e o próprio poder judiciário é o carro chefe dessa mudança, nós advogados não temos opção, temos que participar dessa mudança.”

Inteligência artificial no Direito

Para Seron, estamos vivendo uma etapa inicial da aplicação da IA no Direito. “O sistema Victor (projeto de inteligência artificial do STF) é um desses que usa IA, mas dentro da área de inteligência artificial ele é focado em reconhecer e classificar processos. É uma fase inicial, que para o volume de processos que temos no Brasil já é uma grande tarefa: ele distribui e rotula esses processos, algo que precisaria de muita gente para fazer”, exemplificou o coordenador do grupo de pesquisa Tech Law.

Os participantes do painel também foram questionados sobre a possibilidade de algoritmos de inteligência artificial serem usados para julgar processos. Para Daniel Marques, diretor da AB2L, ainda estamos distantes desse cenário. “O uso da inteligência artificial para decisão no judiciário é uma decisão que vai levar muitos anos para chegar em algo concreto. Atualmente a IA é usada para classificar processos e petições, analisar se falta algum tipo de documento e juntar jurisprudência semelhantes. Ou seja, para auxiliar e melhorar a eficiência do judiciário.”

De acordo com o especialista, um grande desafio para que a IA seja ainda mais aplicada na área judicial é a desorganização dos dados. “Temos 77 milhões de processos, mas que estão desorganizados, o que chamamos na ciência de dados de desestruturados”, explicou Marques. “No corpo do processo ainda é muito difícil a utilização dos algoritmos. Mas temos aí o desenvolvimento da jurimetria para que a gente passa implementar a estatística dentro do direito para estabelecer padrões que aí possam ser utilizados para auxiliar.”

Para Patricia Peck Pinheiro, fundadora da Peck Advogados, tecnologias como inteligência artificial também podem acelerar e facilitar o acesso à justiça. “O uso maior da IA no âmbito da justiça pode permitir mais conhecimento, agilidade, economicidade”, disse a especialista em Direito Digital. “Temos muitas causas repetitivas que não entendo que a IA vá julgar diretamente, mas é possível consolidar todos esses casos iguais e fazer o julgamento da mesma maneira”, analisou Patricia, lembrando que julgamentos distintos geram recursos e esforços desnecessários de tempo e dinheiro de ambas as partes. “O uso dessas novas tecnologias é uma melhoria na gestão privada, na gestão pública, no ganho de tempo, de pesquisa e de conhecimento.”

Perigos e cuidados

Mas para facilitar o acesso à justiça e a democratizar, alguns cuidados precisam ser tomados. É o que alertou Ronaldo Lemos. “Nos EUA, no âmbito da justiça criminal, tem sido adotado uma ferramenta de IA para decidir se uma determinada pessoa que foi presa em flagrante, responderia em liberdade. Ao utilizar recursos de IA para esse tipo de decisão, ficou muito claro que tinha muito resultado insatisfatório, inclusive de discriminação com pessoas negras”.

Segundo o advogado, erros como esse ocorrem por conta de sistemas enviesados e bases de dados escassas, com ausência de informações sobre algumas populações. “É fundamental que sempre que a gente estiver caminhando na adoção de ferramentas como essa, que se tenha também um processo de acompanhamento e auditabilidade permanente, até para evitar que esses erros se enraízem e fiquem cada mais difíceis de serem corrigidos”, alertou Lemos.

“Neste sentido, todo o processo de implementação de IA tem que ser acompanhado de transparência pública, auditabilidade, compreensão de como aquele modelo foi desenvolvido e de como aquela base foi organizada. O desafio é múltiplo, não só tecnológico, mas de transparência de gestão. É isso que garante que uma ferramenta tão poderosa como a inteligência artificial possa num futuro próximo beneficiar imensamente na administração da justiça e na melhoria dos serviços públicos como um todo.”

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Filipe Oliveira

Editor do #Trendings.

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