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Cultura organizacional em home office: os desafios para manter a chama acesa

Patrícia Rodrigues
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Com o trabalho remoto, empresas enfrentam desafios diários para comunicar seus valores e ações entre os colaboradores — e também para o público externo

Se, a partir dos anos 1970, conceitos intangíveis ganharam cada vez mais força para representar (e compor) o valor de mercado de uma empresa, agora é hora de pensar na cultura da organização também fora desse ambiente: no home office. “É no ritual do dia a dia que são transmitidas as ideias que representam a imagem e a reputação que uma empresa quer projetar”, analisa a professora Patrícia Guimarães Gil, da disciplina de Comunicação Organizacional e Corporativa da ESPM.

No entanto, a partir do contexto da pandemia e da adoção do modelo de home office, a fronteira entre o ambiente interno e o externo deixou de existir — e em tempo recorde. “Os funcionários não possuem mais aqueles pontos de encontro fixos, inclusive na hora do cafezinho e do almoço, em que existe o olho no olho para as práticas e trocas coletivas que sedimentam a cultura de uma organização”, complementa.

A cultura organizacional não pode ser vista apenas como algo interno, pois é a forma como uma instituição “se comporta” e “se apresenta”. “Estamos falando de pessoas, da maneira com que elas trabalham, o que têm em comum enquanto grupo e como demonstram isso para quem a vê de fora”, resume.

Mudança de discurso

O grande desafio daqui para frente, de acordo com a professora, é repensar outras formas de coesão e de partilha do que acontece entre os funcionários enquanto parte de uma comunidade. “Mesmo havendo uma mediação bastante facilitada pelas ferramentas tecnológicas, as trocas mais intensas, que são as experiências comuns, deixaram de existir”, enfatiza. “Via tecnologia ou não, é algo que precisa ser renovado diariamente.”

Para a professora, quanto mais tempo em isolamento social, maior o desafio de manter a coesão entre os funcionários e reforçar essa cultura, especialmente nas médias e pequenas empresas. Além do grande processo de reinvenção exigido para se manter em atividade, a maioria terá que reunir essa comunidade em torno de ‘novos’ valores. “Isso vai exigir um esforço de comunicação muito grande, mesmo com todo o aparato tecnológico disponível”, alerta.

Falta de convivência pode desmotivar

No home office, além da diminuição da coesão, a falta da convivência diária pode aumentar a instabilidade do quadro de funcionários. O clima de trabalho e a relação com os colegas também pesam para um funcionário querer continuar em uma empresa, especialmente quando o ambiente físico de compartilhamento de ideias e de valores coletivos é enriquecedor.

Portanto, a empresa tem que representar para o funcionário algo maior que a rotina que ele está cumprindo “Mesmo realizando todas as tarefas do ambiente corporativo, trabalhar em casa pode ser desmotivador quando a cultura vira apenas uma troca de e-mails. Então, quando a única coisa que o prende é o salário, tanto faz estar ali ou em outro lugar”, observa.

Mesmo no contexto de crise — em que praticamente não existe “disputa” por funcionários e há muito medo de cortes — é preciso fortalecer esse vínculo com as equipes, evitando, ainda, a queda na qualidade dos produtos e serviços. “Os vínculos podem ser esgarçados, com reflexos na perda de expressão na sociedade e de valor de mercado”, enfatiza.

Inovação e renovação diárias

Empresas com maior potencial financeiro reforçaram o discurso sobre a importância da saúde, o que possibilitou reproduzir em casa, pelo menos em parte, esse ambiente corporativo com o envio de equipamentos, cadeiras ergonômicas e brindes relacionados a datas e até mesmo parcerias para oferecer terapia online para amenizar os problemas causados pelo isolamento.

Outras corporações se mantiveram presentes na vida do funcionário por meio de iniciativas colaborativas com ONGs, em que ela talvez deixe de aparecer “em primeiro plano”. “Mas não é a realidade da maioria, porque essas ações têm alto custo, especialmente em uma época de corte de despesas”, observa a professora.

Happy hours virtuais na sexta-feira, festinhas em datas comemorativas e até lives patrocinadas foram algumas alternativas para manter a coesão e a motivação das equipes, especialmente no início da crise. No entanto, a fórmula funcionou por um tempo, mas já está desgastada. “Vivemos conectados o tempo todo e há ainda um bombardeio de informações. As pessoas estão sobrecarregadas.”

Para Patrícia Gil, o desafio para as áreas de comunicação é ainda maior — tanto interna quanto externamente — para inserir essa ‘nova’ cultura organizacional e corporativa, que hoje aposta muito em webinars, calls, lives. “A criatividade será fundamental para reinventar o modelo, reforçar a cultura, manter-se presente e, ao mesmo tempo, vencer essa fadiga de informação sem muitos gastos”, finaliza.

Imagem externa é cada vez mais importante

Além da questão interna, as empresas precisam ainda lidar com o compartilhamento de seus valores para o público externo, cada vez mais importante para sustentar a marca, assim como seu posicionamento. A pandemia vem revelando como algumas delas conseguiram se sobressair durante esse processo, expressando de maneira clara seus valores a fim de fortalecer sua imagem.

“Mensagens e discursos que antes enfatizavam a liderança de mercado e a qualidade de produto deixaram de ser importantes porque simplesmente não fazem mais sentido para as pessoas”, lembra. “Dessa maneira, as empresas que assumiram bandeiras e causas sociais se destacaram em um momento de grande questionamento sobre os valores de consumo”, reforça Patrícia Gil.

Algumas marcas que abraçaram causas sociais também conseguiram trazer esses valores para suas plataformas de negócio — alguns exemplos são o Magazine Luíza, o Ifood e as ofertas de microcrédito dos bancos, que criaram ações bem estruturadas para expressar o seu olhar social e promover soluções específicas. “A crise sanitária exigiu um posicionamento rápido e muita empresa ‘escorregou’ na hora de explicar o papel do seu negócio nesse momento”, avalia.

Mas nem sempre é positiva

Por outro lado, organizações empresariais extremamente autoritárias reproduzem esse traço também no home office, com o uso de ferramentas de inteligência artificial para o monitoramento das atividades. “Se na cultura não há o apreço pela saúde ou o bem-estar do funcionário, do ser humano ou da sociedade, isso se reflete na satisfação do cliente final. Isso também ficou mais aparente para algumas marcas”, explica a professora. “Afinal, o colaborador também tem o papel de atuar como um defensor do negócio, inclusive quando ele está logado nas suas próprias redes sociais.”

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Patrícia Rodrigues

Jornalista colaboradora do Trendings.

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