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“O protecionismo não deverá se manter no comércio internacional”

Jorge Tarquini
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Essa é a análise de Manoel Guedes Neto, professor do curso de Relações Internacionais da ESPM-SP, sobre o que está por vir na fase pós-pandemia

Depois de mais de um ano e meio de incertezas causadas pela pandemia – e não somente no trágico cenário de contágio e de mortes, mas também no abalo causado nas economias pelo mundo todo –, o avanço da vacinação (mesmo que de forma desigual) já permite fazer uma análise do que vivemos e também pensar em prognósticos.

Para nos ajudar a entender melhor tudo isso, fomos conversar com Manoel Guedes Neto, professor do curso de Relações Internacionais da ESPM em São Paulo. Graduado em Relações Internacionais com ênfase em Marketing e Negócios e com especialização em Negociações Econômicas Internacionais pelo Programa San Tiago Dantas (UNESP, 2012), ele é Mestre em Administração com concentração em Gestão Internacional. Atuou como consultor da área corporativa da ESPM em programa voltado à capacitação de pequenas e médias empresas para a dinâmica de comércio exterior, em parceria com a InvestSP e a Apex Brasil. Atualmente, é doutorando em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB), assumindo a linha de pesquisa sobre Governo e Política Externa.

Quais foram os principais prejuízos para o comércio global no período da pandemia?

No início da crise econômica imposta pela pandemia, muito se refletiu sobre os desafios impostos ao comércio internacional, principalmente sobre as economias mais vulneráveis. Apesar da gravidade desse cenário, podemos considerar que atualmente o desempenho comercial tem se apresentado favorável, visto que os índices dessa dinâmica apresentavam sinais de queda desde 2018. As transações internacionais sofreram uma redução de 15,6% nos primeiros meses da pandemia – entre março e maio de 2020 –, conforme índice apresentado pelo IPEA. Dentre as atividades que mais sofreram com essa realidade, podemos mencionar as importações de petróleo, de bens de capital e de bens de consumo.

Vivenciamos iniciativas protecionistas de muitas nações nesse período. Você acredita que elas tendem a se tornar uma constante ou haverá uma volta às relações comerciais mais abertas entre os países?

A imprevisibilidade inicial causada pela pandemia levou alguns governos à prática do protecionismo em setores considerados essenciais, alternativa adotada para amenizar os efeitos das instabilidades econômicas. Essa tendência de imposição de barreiras unilaterais foi uma conduta que direcionou novas práticas, a exemplo da nacionalização produtiva (de bens até então importados) e à regionalização comercial, em detrimento da integração global. Por conta das incertezas, as práticas protecionistas mais comuns foram os estímulos para a proteção da indústria local, incluindo a concessão de subsídios e a oferta de créditos com taxas de juros reduzidos. No entanto, o protecionismo de modo geral não deverá se manter, visto que o comércio internacional é fundamental para viabilizar a escala produtiva e a oferta de produtos a preços acessíveis. Por isso, as condutas autossuficientes não são sustentáveis, visto que as formas de restrição ao comércio desmantelam as cadeias de suprimento e expõem a economia a choques de oferta e de preço.

Já há algum sinal de retomada?

Os níveis de transação passaram a crescer à medida que formas de flexibilização sobre o distanciamento social passaram a ser adotadas – inicialmente pela China e demais países asiáticos, e posteriormente pela Europa e Estados Unidos – possibilitando a rápida recuperação das práticas comerciais. A China foi o país que mais rapidamente superou a crise econômica causada pela pandemia, favorecida pelo redirecionamento para desenvolver tecnologias avançadas (como o 5G) e sua postura de promoção da liberação dos mercados. Por conta das transformações e prioridades impostas pela pandemia, determinados setores foram beneficiados nas recentes dinâmicas comerciais, a exemplo dos produtos agroalimentares e dos produtos médicos e farmacêuticos.

E quais são os prognósticos de crescimento – e como o Brasil se encaixa neles?

Em termos de perspectivas para os próximos anos, a projeção do Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgada em abril apresenta um crescimento estimado de 6% da economia global para 2021 e de 4,4% para 2022. Por sua vez, a expectativa para a economia brasileira é de crescimento de 3,7% neste ano e de 2,6% para 2022. No entanto, a retomada da economia tem ocorrido de modo desigual entre os países, sendo que a consistência da recuperação dependerá do avanço da imunização contra a COVID-19 nas diferentes regiões do planeta. Assim, apesar do cenário de 2020 ter sido melhor que o esperado, é preciso considerar os desafios e transformações no pós-pandemia conforme a dinâmica de cada setor produtivo e as ações protecionistas ou liberalizantes assumidas pelos diferentes governos.

Como as empresas, principalmente as micro e pequenas, têm driblado o cenário caótico e conseguido resultados positivos no último ano?

Os efeitos da pandemia de fato têm apresentado profundas dificuldades para os empresários. Uma pesquisa realizada em novembro de 2020 pelo Serasa Experian com uma amostra de 521 empreendedores revelou que 49% das micro, pequenas e médias empresas sofreram impactos negativos relacionados à pandemia de COVID-19. Dentre os principais impactos e desafios associados à queda nas vendas revela-se a necessidade de redução de custos e despesas, de revisão de contratos, de renegociação de empréstimos e a diminuição do quadro de funcionários. De modo a driblar esse cenário, as empresas têm buscado meios de desenvolver novos canais de vendas e novas ferramentas de relacionamento. Os meios empregados estão relacionados à atuação em canais de venda online por meio da adoção do WhatsApp e do Instagram por microempresas, e de investimentos em e-commerces próprios pelas pequenas e médias empresas. Os benefícios atrelados a essas ações são o ganho de exposição, a presença em diferentes regiões do Brasil e a conquista de diferentes grupos de clientes, contribuindo para a segmentação dos consumidores e personalização das interações.

Você tem notícias de iniciativas de diplomacia corporativa que deram bons resultados nesse período?

Um exemplo que envolve não apenas líderes empresariais, mas também ONGs e associações, é o movimento UNIDOS PELA VACINA, iniciativa que surgiu pela mobilização de Luiza Helena Trajano e do Grupo Mulheres do Brasil com o objetivo de articular junto a governantes e à sociedade civil medidas para superar as barreiras no processo de vacinação em todos os estados e municípios brasileiros. O principal propósito do grupo é tornar viável a vacinação de todos os brasileiros até setembro de 2021. A atuação se desenvolve sobre a cadeia produtiva de vacinação, desde a aquisição pela iniciativa privada de agulhas, seringas e insumos até o auxílio com o transporte e armazenamento das doses de vacinas. Existem também ações para a doação de refrigeradores, termômetros para caixas térmicas e computadores, além das estruturas de montagem de drive-thrus de vacinação. Em outras palavras, estamos nos referindo à criação de uma rede de apoio para a estrutura de vacinação que estabelece uma ligação entre o setor privado e o gestor público. O papel frente à sociedade civil diz respeito à conscientização e engajamento da população ao Plano Nacional de Imunização.

E houve movimentações também no âmbito internacional?

Em relação à abrangência internacional, pela qual se verificam ações de Diplomacia Corporativa, devemos valorizar a mobilização dos empresários na negociação do Brasil com outros países no intuito de facilitar a compra dos imunizantes. Um exemplo se refere à articulação dos empresários junto ao governo federal no sentido de obter doses excedentes oriundas dos Estados Unidos, negociações que ocorreram via embaixada e representantes do congresso americano. Trajano, em seus posicionamentos sobre as ações do movimento, ressalta também as negociações com investidores e com laboratórios internacionais para a garantia de insumos ao Brasil. Desse modo, nos deparamos com a relevância e influência de empresários que conseguem transitar em diferentes frentes e perante diferentes interlocutores, complementando condutas que se esperaria de líderes governamentais em um primeiro momento.

Se tivesse um conselho a dar para pequenas e médias empresas neste momento, qual seria?

Como recomendações para a plena retomada das atividades no pós-pandemia, as PMEs devem direcionar investimentos em sua capacidade de adoção de atendimento remoto, ao mesmo tempo em que devem considerar o aperfeiçoamento da gestão financeira e a aquisição de tecnologias voltadas à segurança cibernética. Além disso, é fundamental a busca por uma consultoria para diagnosticar as áreas que necessitem de melhorias em suas práticas, além do acompanhamento da evolução do estado da arte tecnológico presente nas respectivas áreas de atuação. Para tanto, é necessário investir em constantes formas de qualificação que beneficiem funcionários e proprietários. Excelentes opções nesse sentido são oferecidas pelo SEBRAE e pelo Serasa, em termos de gestão financeira e empreendedorismo, e pela Apex Brasil, em relação à capacitação para atuação internacional.

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Jorge Tarquini

Curador do #Trendings.

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