Toda vez que falo sobre esse assunto “carreiras meteóricas”, me lembro da minha própria trajetória. Afinal, fui um dos diretores de redação mais jovens da história da Abril quando assumi a revista Quatro Rodas quando ela era a 9ª maior revista do país em circulação e faturamento publicitário, em meados dos anos 1990.
Com 27 anos e pouco mais de seis anos de carreira, havia passado de repórter foca (o jornalista recém-formado) a editor, editor executivo, redator-chefe e, finalmente, ao topo da montanha de uma redação: sua direção.
O que pouca gente sabe é que, quando me foi oferecida a posição, eu a recusei. Sim: disse não. Eu tinha plena consciência de que já havia caminhado rápido e, não sei se por sorte ou algum talento real, havia me saído bem em cada novo cargo para o qual era promovido. Mas encarar mais essa poderia ser abusar da minha “sorte de principiante”.
Deixei isso muito claro para a alta direção da Abril – que me fez lembrar tudo o que já havia vivido desde que havia entrado lá pelo Curso Abril de Jornalismo, que recrutava os melhores recém-formados em Jornalismo de todo o Brasil a cada ano para um mês de imersão no universo “revisteiro”.
Nesse tempo, havia participado de um longo e profundo processo de reengenharia na editora, como parte do time da casa. Tínhamos embates acalorados com os consultores contratados para desenhar novos processos em cada pedacinho da empresa – da colorização de quadrinhos ao embarque de revistas com destino ao Amazonas. Nessa experiência, me vi nas redações das revistas Time e U.S. News, em visitas para entender e aprender modernos processos editoriais e de trabalho dessas grandes publicações.
E, claro, aprendi muito sobre cada pedacinho da própria Abril: mergulhei em assuntos tão distintos quanto compra de papel, segredos da impressão, distribuição, venda de publicidade, contato com bancas e assinantes. Ah, claro: e a ver como cada tipo de revista era produzida.
Eu não tinha ligado os pontos, mas tudo aquilo havia ajudado a me formar como um publisher. Afinal, estava entendendo a escolha e o convite para tudo aquilo. Mas isso não diminuiu minhas dúvidas sobre aceitar ou não a nova posição. Eu estaria preparado para agir com equilíbrio e sabedoria nos embates com anunciantes, que geralmente eram as mesmas montadoras de automóveis que seriam as fontes jornalísticas e o tema de nosso Jornalismo?
Como seria liderar uma redação que, à época, reunia quase 50 profissionais, entre repórteres, editores, profissionais de arte e design, fotógrafos e pilotos de teste – além de profissionais administrativos?
A franqueza com que essas conversas foram feitas e a franqueza da própria direção da Abril foram fundamentais para minha decisão. Eles deixaram claro que a escolha pelo meu nome não era uma “juniorização” da posição, mas a aposta em um jovem em cuja formação eles já vinham investindo.
E reiteraram que eles tinham consciência de todos os “buracos” da minha formação e dos desafios que enfrentaria. Mas que, ao aceitar, eles também aceitariam estar ao meu lado, abertos a entender tanto minhas inseguranças quanto minhas lacunas. E que a última coisa que eles queriam era queimar minha carreira: eles haviam investido muito (e investiriam ainda mais) na minha formação – sim, continuaram a me mandar estudar em lugares bastante especiais, como a Stanford University, ou a aprender com meus pares, em outras editoras e revistas ao redor do mundo.
Ficou claro que eu não estava ocupando aquela posição por falta de opção: eu era a opção da Abril. Não era por economia (sim, eu ganharia o piso da posição…), não era por falta de profissionais preparados para a posição, não era para ser mais fácil me descartar se eu “desse errado”.
Tudo o que escrevi foi apenas para ilustrar: se você, jovem profissional, de repente for alçado a um posto mais alto na hierarquia, analise:
Ser realista (e não deslumbrado) pode ser a diferença entre realmente construir uma carreira ou enterrá-la por uma pressa descabida?
Só para registro: foram oito anos muito pródigos dirigindo revistas na Abril.
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