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“A idade não interfere na capacidade de inovação”, diz pesquisador

Jorge Tarquini
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Quem afirma isso é Victor de La Paz Richarte Martinez, professor da ESPM-SP e pesquisador de gestão de pessoas, diversidade e inovação nas organizações

Já ouviu falar em Gestão de Pessoas para Inovação? Em tempos em que inovar é a rotina de 99% dos negócios e atividades humanas, o assunto precisa ser conhecido e discutido em profundidade. Por isso, o Trendings foi conversar sobre o tema com Victor de La Paz Richarte Martinez, professor da ESPM – onde também supervisiona o Núcleo de Pessoas nas Organizações – NUPO, parte do Centro de Novos Negócios da ESPM. Gestão de pessoas para inovação e comportamento são exatamente a área de pesquisa, ensino e de trabalho do especialista, que também é pesquisador sobre diversidade, gestão de pessoas e comunicação em equipes, além de atuar no mercado como consultor organizacional.

Gestão de pessoas para inovação é um dos temas que você estuda, leciona e também trabalha como consultor. Qual a diferença dessa modalidade para as demais formas de gestão de pessoas?

Gestão de pessoas no Brasil se usa como sinônimo de RH. Internacionalmente, porém, recursos humanos (human resources) é uma área da empresa que cuida do capital humano, do desenvolvimento das pessoas, das competências, que trabalha processo seletivo, treinamento, avaliação. No Brasil, isso também é entendido como gestão de pessoas – por isso é importante destacar a diferença entre as duas coisas. RH tem um aspecto mais organizacional. Quando a gente fala de gestão de pessoas, extrapolamos para trabalhos em equipe – e aí não é só RH. Nesse sentido, um gestor de fábrica ou um chefe de setor de logística, por exemplo, é um gestor de pessoas. Então, sempre que uma lidera uma equipe, faz gestão de pessoas. Estabelecida essa diferença, a gestão de pessoas para inovação é uma outra instância.

E qual seria essa instância em que se encontra a gestão de pessoas para a inovação?

Primeiro temos de diferenciar inovação de criatividade – que é algo inerente ao ser humano. Todo mundo é criativo ou poderia ser mais criativo – e todos têm potencial para isso. Já a inovação é a criatividade em algum serviço ou produto que seja útil. Ou seja: criativo todo mundo é – mas não significa que seja inovador. A pessoa pode ser só criativa, mas não coloca isso em prática. Então, deixa de ser inovadora. E um produto ou serviço só é inovador quando atende às necessidades reais das pessoas. Por isso, não basta ser criativo, tem de ser inovador.

“Um produto ou serviço só é inovador quando atende às necessidades reais das pessoas”

E qual o papel do gestor de pessoas no processo de inovação?

O gestor de pessoas em equipes precisa favorecer que as pessoas sejam inovadoras, que fomentem a inovação. Ou seja: ter um mindset diferente, ser uma pessoa com abertura  ao erro, saber que, para ser inovadora, pessoas e equipes precisam entender que haverá erros, tentativas, que não serão sempre bem-sucedidas, que leva tempo. Processos e produtos inovadores levam tempo, não acontecem de uma hora para outra. Esse gestor tem de criar um clima de trabalho que permita a expressão da criatividade sem retaliação, sem bullying, no qual todas as pessoas tenham voz, um espaço de comunicação com voz e escuta.  Se esses fatores não estão presentes, as pessoas tendem a colocar barreiras na expressão das ideias criativas. Se você está em uma equipe ou em um grupo de pessoas em que não encontra respeito e nem consideração, a tendência é se calar. Para que você vai expressar uma ideia se você é ridicularizado, boicotado, se não é valorizado? Fatores importantes em gestão de pessoas para inovação: reconhecimento do potencial individual, favorecimento de um clima de trabalho muito positivo, abertura ao erro, saber que os prazos não são imediatos. E propiciar espaço para diálogos e feedbacks positivos.

“Se você está em uma equipe ou em um grupo de pessoas em que não encontra respeito e nem consideração, a tendência é se calar”

Todos têm chance de se inserir nesse cenário de inovações ou há profissionais que correm o risco de não desenvolver habilidades e competências em cenários de inovação?

Todo mundo tem condições de entrar em cenários inovadores. O fundamental é conhecer a área, o tema em que se está inserido. Se você já conhece, tem interesse, motivação e alinhamento de valores em determinada área, a tendência é ser criativo e inovador. Numa dimensão individual, é fundamental criatividade, apostar nela, investir, estimular a criatividade – e ter forte capacidade de aprendizagem e coragem de arriscar, sabendo que pode dar errado. Se a pessoa é criativa mas não expõe as ideias, fica só com ela mesma, dificilmente ela vai participar de equipes inovadoras.

Como unir dimensões individuais e coletivas nesse processo?

Nos processos de inovação se erra, buscando o acerto, claro – e justamente ao buscar o acerto você tem de refletir, tem de aprender. Mas a pessoa tem de gostar do produto, do serviço, do tema. Por isso é fundamental o autoconhecimento: essa é a primeira, a grande sacada. Os meus valores, o meu conhecimento, a minha motivação, o meu desejo têm a ver com essa área que estou trabalhando, com essa equipe, com esse produto? Se a resposta for sim, entra a dimensão pessoal: autoconhecimento, criatividade, coragem de arriscar, tolerância ao erro. Mas, claro, na dimensão organizacional tem de ter um espaço de tempo para a criação de uma equipe inovadora, diversa em vários aspectos, como pontos de vista, experiências. Então, temos três dimensões: a individual, a grupal e a organizacional.

Como a Gestão de Pessoas para a Inovação encara questões individuais, como a alta carga de ansiedade que mudanças podem trazer ou a planificação que diminui o espaço da individualidade?

Estruturas engessadas dificilmente terão espaço para criatividade e inovação. Espaços muito estressantes tendem a boicotar, bloquear o processo. Estressante desde a questão do tempo, que é raro e em que todo mundo está sempre assoberbado de tarefas – situação em que dificilmente se terá ideias criativas. Tem a questão da estafa mental, que o excesso de atividades pode acarretar – e que vai bloquear a criatividade. Tem a questão das interações pessoais, que precisam de um ambiente amistoso, respeitoso, mais leve. Porque a criatividade tem raízes psicológicas, inclusive na infância, pois ela advém de espaços do “play”, do brincar, do ser leve. Tem um psicólogo húngaro, Mihaly Csikszentmihalyi, que fala do flow, um espaço mental em que você deixa as ideias percorrerem, um processo mental que não é sistemático.

“Estruturas engessadas dificilmente terão espaço para criatividade e inovação”

E como lidar com a ansiedade natural da natureza do trabalho?

É fundamental no plano individual a inteligência emocional: como você vai lidar com os problemas que aparecem, as situações de conflito que impedem criatividade. Então, inteligência emocional é autoconhecimento: de que forma eu sou mais criativo, em que momentos sou mais criativo? Pessoalmente, sou mais criativo nas primeiras horas da manhã. Com as atividades do dia a dia, vai diminuindo essa capacidade – mas claro que ela pode aparecer em vários momentos ao longo do dia. Mas é importante ter esse autoconhecimento: em que momentos do dia e em que situações e ambientes sou mais criativo? Isso tem a ver com autoconhecimento e inteligência emocional. Claro que ambientes engessados e burocratizados, com chefes cobradores de atividades, são o contrário dos que criam clima de trabalho favorável à criatividade, à produtividade e à expressão pessoal – que são os que estão alinhados com inovação nas empresas e na vida mesmo.

As dificuldades impostas pela inovação realmente se tornam maiores com a idade ou um nativo digital e um profissional acima dos 40 anos podem trilhar caminhos semelhantes quando o assunto é inovação?

A idade não interfere na capacidade de inovação – depende mais do mindset, o estado mental. Vocês falam de uma pessoa de 40 anos, por exemplo. Para ser ainda mais radical, podemos falar de alguém de 60 ou 70 anos – e ela pode ser altamente criativa se ela está em um campo de conhecimento e de atuação que lhe seja prazeroso ou que ela conheça ou deseje conhecer. Para você ser criativo, tem de ter algum conhecimento prévio, alguma base de conhecimento até para que você pense em aplicações diferentes. A idade não interfere na criatividade. Temos pessoas muito criativas, por exemplo, nas artes e na academia e no dia a dia das empresas. Como consultor em inovação, neste momento inclusive, estou fazendo um trabalho numa empresa em que há pessoas de 50 e poucos anos, jovens de 25 e uma de 78 anos – e que tem ideias ótimas. Claro que depende de saúde física e mental, mas não da idade. Vamos pensar no campo das mídias sociais. Você pode encontrar pessoas de 50, 60, 70 que estão envolvidas no mundo do trabalho das mídias sociais, por exemplo, que são muito antenadas e se envolvem até mesmo com propostas de novos serviços. E você pode pegar um jovem de 20 anos que não se interessa por esse universo e que não consegue ter essa leitura. O jovem deve investir no autoconhecimento para identificar as áreas e campos de conhecimento e atividades em que sente mais prazer e se encontra mais livre em um estágio de flow. E, principalmente, em quais áreas esse jovem se sente bem atuando e sendo reconhecido. Dificilmente você vai ser inovador em algo que você não curte ou atividades que você não suporta.

“A idade não interfere na capacidade de inovação”

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Jorge Tarquini

Curador do #Trendings.

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